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quarta-feira, 23 de abril de 2008

A NATUREZA DE SERVIÇO DA IGREJA

Se olharmos a igreja local do ponto de vista da sociologia, percebemos que ela se caracteriza como “grupo de referência” porque espera-se que seus membros se comportem de acordo com as expectativas dos demais. Mas ela também é classificada como “grupo primário”, porque entre as condições físicas para sua formação está: 1. a exigüidade; 2. a proximidade entre seus componentes e 3. a permanência nas relações. As relações sociais nos grupos primários são caracterizadas pela intimidade, informalidade e espontaneidade. Sociologia é a ciência que observa o que é constante nas relações sociais para, daí formular suas generalizações teóricas. O homem é um ser social e religioso e a leitura que os sociólogos fazem da igreja como grupo primário e de referência é importante se vista pela ótica sociológica, mas ao mesmo tempo há dimensões que se alcança no agregar do povo de Deus que nenhuma ciência humana é capaz de estudar porque foge aos limites dos fenômenos sociais, posto que transcendente. Todo grupo social deve levar em conta que as boas relações devem ser um princípio básico de organização.

Neste post vamos analisar o significado de ser igreja, atentando para as relações que vão além da conduta social. É na permanência da comunhão e na reunião pública e coletiva que queremos enfatizar nosso estudo. Por que com certa freqüência vemos o abandono da reunião e, por conseguinte, da comunhão mútua; por motivos superficiais.

Umas das bases de nosso estudo está em Hebreus 10. 25. Analisemos o contexto. Ele começa em 10. 19 e encerra em 13. 25. São conselhos acerca de vários aspectos da vida prática, bem como da fé e disciplina. Em 10. 19-39 o autor salienta que a posição do crente é aquela do novo e vivo caminho (10. 19-25), oferecendo acesso a Deus com intrepidez (v. 19) pelo sangue de Cristo. Então se pode notar que este acesso jamais se fará sem a mediação de Cristo; mas ao mesmo tempo com ousadia, pois a exortação se expressa em três etapas: 1. Nossa aproximação (v. 22); guardar-nos firmes (v. 23) e a consideração mútua para que o amor e as boas obras sejam estimuladas (v. 24). Então o povo reunido oferece: a) Devoção pessoal; b) mantém consistência e c) mantém os deveres sociais. O povo, na comunhão do Espírito faz isso: 1. Com coração sincero, 2. Em plena certeza da fé e 3. Com o coração purificado de má consciência. A palavra para estimular (gr. paroxysmon) no verso 24 é incentivar ou incitar no bom sentido do termo, ao amor e às boas obras, implicando que deve haver esforço coletivo, mais do que individual para que o amor aconteça. Não é algo que acontece automaticamente, se está claro que devemos promover o estímulo mútuo para que o amor e as boas obras aconteçam. Através de uma ação conjunta será fácil notar que se cria maior possibilidade ao amor altruísta, quando este se dá através de uma base de comunhão, ou seja, a igreja.

Então, se notamos a exortação do escritor aos hebreus no verso 24 “e consideremo-nos uns aos outros...” seguindo do alerta “não deixemos de nos reunir como igreja...”, obviamente a negligência à reunião constitui-se na falta de consideração mútua e vice-versa. E tanto a negligência em cultuar, quanto a falta de consideração com os problemas do irmão, não são menos que orgulho, por que este leva ao desprezo. Olhando para o verso 24 e 25 Calvino explica que a exortação é dirigida particularmente aos judeus, porque estavam orgulhosos por serem tidos como único povo escolhido por Deus. Pensavam que mantinham o direito exclusivo de Igreja e, quando os gentios foram inseridos no corpo, ficou notório o desconforto, a ponto de o apóstolo apelar aos judeus para que não se indispusessem com a presença dos gentios exortando “consideremo-nos uns aos outros” (v. 24) e, para reforçar seu argumento, o apóstolo exorta “não deixando de congregar-nos” (v. 25). Deus quis unir os gentios à Igreja, mas os judeus viam nisso uma afronta humilhante, a ponto de se separarem da Igreja. Na igreja de hoje, mesmo não sendo comum os conflitos de natureza étnica, nos recusamos se igualar com os que, dentro de nossa ótica, destoam de nosso estilo (às vezes medíocre) de enxergar o reino de Deus. Não levamos em conta que “não são os que têm saúde que precisam de médico, mas os doentes” (Mt 9. 12).
Nossa próxima base é Efésios 1. 22. No simbolismo de cabeça-corpo, vemos a riqueza da relação íntima de amor e vida entre Cristo e sua Igreja. Mas notamos que o amor aqui corre em vias de mão dupla, ou seja, tanto recebemos o amor (5. 25-33), quanto retribuímos. A retribuição se dá a Cristo em resposta ao seu amor por nós e reciprocamente, ou seja, uns aos outros (1. 5; 2. 4; 3. 19). Para a análise da difícil expressão “a plenitude daquele que enche tudo em todos”, William Hendriksen chegou à conclusão de que a igreja é o complemento de Cristo. Quer dizer: 1. Até que Cristo se una a nós, ele se considera, em certa medida, incompleto. Cristo como o esposo, se considera incompleto sem a esposa (a igreja). 2. Isto não significa diminuir um só milímetro de sua majestade e auto-suficiência. Mostra o quanto sua igreja é importante e o quanto, como seu povo, podemos nos alegrar porque sua comunhão é tão íntima com sua igreja, a ponto de seus planos eternos estarem bem amarrados ao futuro de seu povo eleito. O desprezo ao corpo vivo de Cristo representa deficiência na compreensão desta profunda doutrina.

Olhando para a natureza de serviço da igreja notamos que a dimensão total da comunhão primeiramente se centraliza em Deus e depois no próximo. Apenas a comunhão contínua com o corpo nos dará condições de perceber suas deficiências e suprir suas necessidades através dos dons. Pedro disse: “Cada um exerça o dom que recebeu para servir aos outros, administrando fielmente a graça de Deus em suas múltiplas formas” 1 Pe 4. 10 (NVI). A finalidade dos dons é indicada por Pedro: “para servir aos outros”. Seguindo o modelo de Jesus que, como servo de Deus, “não veio para ser servido, mas para servir” (Mc 10. 45), entendemos que a vida cristã é vida de serviço aos outros. Então será na manifestação do Espírito entre o povo (concedendo dons) que visaremos o bem de todos (1 Co 12. 7). Note o “servir aos outros” de Pedro e “bem comum” utilizado por Paulo chamando nossa atenção para o aspecto fundamental da unidade da igreja como o cenário de atuação do serviço do crente. “O aperfeiçoamento dos santos” (Ef 4. 12) não é possível sem o serviço de cada crente. O método que Deus estabeleceu para nossa edificação leva em conta o serviço de cada um, já que dons são sempre para serviço (1 Co 14. 12, 26). Ignorar a reunião e a participação no corpo, será sempre sinal de egoísmo e fraqueza espiritual, porque a igreja é a agência pela qual temos a oportunidade de servir tomando consciência das necessidades materiais e espirituais de nossos irmãos, mostrando que o amor de Deus está em nós (1 Jo 3. 17). Há dois modos através dos quais o mundo enxerga Deus em nós: 1. Através de nosso sincero interesse pelas necessidades da igreja (At 2. 47); 2. E de nosso amor que vai além das palavras (1 Jo 3. 18).

Um dos propósitos que levou o escritor aos hebreus a exortar os irmãos: “não deixemos de congregar-nos” (Hb 10. 25) é, sem dúvida, o de promover oportunidade para a prática do amor mútuo e das boas obras (Hb 10. 24), como comentou Donald Guthrie “É lógico que nenhuma provocação ao amor é possível a não ser que ocorram oportunidades apropriadas para o processo de despertamento ter efeito”.[1] A igreja como coletividade reunida e na capacidade do Espírito, oferece plenas condições para mostrar que a maior marca do crente é o amor. Tomando consciência deste fato, o mundo verá a glória de Deus em nós (Jo 17. 22, 23; 1 Jo 4. 12), como disse John Stott: “é pela qualidade de nosso amor que Deus se faz visível hoje”.[2]

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[1] Donald Guthrie, Hebreus, introdução e comentário, (São Paulo-SP, Vida Nova, 1991) p. 202.
[2] op. cit., p. 283.

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