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quarta-feira, 12 de março de 2008

QUEM É MEU PRÓXIMO, MESMO?

Meu propósito, neste post é discutir a quem nossa boa ação é dirigida? Parece uma pergunta inócua, mas você já parou para pensar que a igreja neotestametária, ainda sob a liderança dos apóstolos, conquanto tivesse uma ação social altruísta, humanizadora e abrangente; ainda assim, circunscrita apenas aos que faziam parte da Igreja visível (At 2. 45)? Ora, se cremos na palavra inspirada e, igualmente, que ela foi deixada a nós como prescrição infalível da parte de Deus e que, por ser esta a característica da palavra, devemos fazer apenas aquilo que está prescrito, é razoável a pergunta: É apropriada nossa ação social voltada para os que são estranhos à fé? Interferimos na ordem proferida por Deus através de Paulo quanto à prioridade de atendimento das necessidades básicas dos domésticos da fé (G 6. 10)?

O que dizer do apelo que o apóstolo João faz no sentido de acurdirmos os que, estando em nosso meio, precisam de suprimento para as necessidades básicas (1 Jo 3. 17)? Com base nesta elaboração do problema, gostaria de lidar com a parábola do bom samaritano em Lucas 10. 25-37 porque creio que Jesus responde tais questionamentos e, com isso, nos instrui quanto à pergunta: Quem é meu próximo?

Soa retórica esta pergunta, não acha? Entretanto, a retórica cumpre exatamente a função de mexer na nossa consciência. Ou seja, pelas minhas ações, será que já entendi, de verdade, quem é o meu próximo. Não estou, cinicamente, agindo como aquele escriba da parábola, que fez um arranjo de textos da própria palavra para justificar sua omissão?

Olhando para o contexto da parábola, notamos que a pergunta feita pelo escriba foi: Que farei para herdar a vida eterna? Perceba que Jesus ilustra seu argumento com uma parábola, cujo conteúdo é exatamente o lugar das obras na vida de alguém que pretende herdar a vida eterna. Então a vida eterna será alcançada com base nas ações? Herdar a vida está intimamente ligado, e se condiciona à condição de ser um neo bom samaritano? A lei é clara em mostrar que devo amar a Deus acima de todas as coisas e o meu próximo como a mim mesmo (Dt 6. 5; Lv 19. 18; Mc 12. 30-31) e, se ela aparece sob o Novo Testamento, como um mandamento de Jesus, obviamente, trata-se da lei do amor que jamais prescreve ou entra em decadência.

Curioso é que Jesus parece associar o fazer com o herdar a vida quando arremata dizendo ao escriba: "Faze isto e viverás" (v. 28). Precisamos entender o propósito de Jesus aqui. Note que o escriba não estava tão interessado em vida eterna, senão em testar a argumentação exegética de Cristo quanto à interpretação de Lv. 19. 18. Então ele impressiona o escrita quando lança mão da parábola. Veja: Um homem é assaltado quando vai de Jerusalém para Jericó. O percurso de cerca de 27 km era perigoso e pedregoso. Supõe-se que tal homem era judeu, embora isso não esteja claro na parábola.

Por casualidade passou por ali um sacerdote. Mas o que os sacerdotes faziam? Eram responsáveis pelos serviços religiosos do templo. Geralmente eram bem vistos pela sociedade. Qual sua reação? Indiferença. Talvez induzido pela própria interpretação da lei que impedia que o sacerdote tocasse em morto, sob perigo de impureza e, talvez fosse o caso daquele homem estar não apenas caído, mais também, morto. Neste momento a obtusa compreensão sobre o amor impediu tal sacerdote que, ao menos gritasse a fim de averiguar se se tratava mesmo de um defunto. Não seria essa nossa escusa para não ajudar o próximo sem regeneração? Indagamos: "Já tá morto. Não há o que fazer!"Às vezes vamos além, quando se trata de prostitutas, homossexual, drogados, então concluímos erroneamente: "Já cheira mal!". Erroneamente porque o amor maduro deve nos ensinar o amor ao próximo, a despeito das ações do próximo, embora tenhamos imensa dificuldade em dissociar as duas coisas. Ainda que a lei impedisse que um santo sacerdote tocasse em um defunto, o amor, muito mais que as regras religiosas, não teria condições de criar novas alternativas para aquele momento? Certamente, há muito o que se pode fazer que, meramente passar de largo sob a preconceituosa suspeita de que o transeunte está morto.

Um levita também passou pela vida em declive daquele pobre judeu (v. 32). Qual era a função de um levita? Também envolvido, de certa forma, nos serviços religiosos do templo; não se apiedou dele e, quem sabe movido por uma distância colossal entre a mera religiosidade e a lei do amor (Mt 7. 12; Gl 6. 2), passou de largo. Talvez se propunha em fazer um arranjo de argumentos frouxos com base na omissão do sacerdote. Assim como muitos de nós que, no intuito de justificar nossa omissão, relegamos as boas obras, a área social e o cuidado geral com a civilidade e a cidadania aos órgãos de governo. Entretanto, ainda que o governo tenha deveres diretos e concretos, já que os impostos que arrecada, são igualmente diretos e concretos, há elementos da fé que nutrem a esperança e o amor, cuja competência foge à natureza dos órgãos de governo e que, por sua vez não podem ser oferecidos por ninguém mais, além dos iluminados que vivem na fé.

Em seguida, outro ser humano se aproximou do homem violentado e semimorto. Era um samaritano. Por alguns séculos precedentes à vinda de Cristo, houve uma grande rixa política e cultural entre judeu e samaritano (Jo 4. 9). Esse tempo durou cerca de 800 anos, porque em 722 a. C, Senaqueribe (Sargão II), rei da Assíria, tomou Samaria e substitui seus habitantes por babilônios e sírios, com isso mudaram completamente a cultura judaica em Samaria.

Diferentente dos dois religiosos e peritos da lei anteriomente citados, este, quando fixou os olhos no homem caído, tendo passado perto dele (e não longe como os demais) imediatamente "compadeceu-se dele" (v. 33). Então passa a acudi-lo em termos práticos. Não ficou apenas na piedade aparente. Não era meramente um compadecer-se sem envolvimento ou contemplativo. Tiago lembra bem sobre o perigo de tomarmos conhecimento de necessidades de roupa e alimento de nossos irmãos e, como se nada tivéssemos com isso, mandarmos ir em paz (Tg 2. 15-17). Se esta for a atitude, certamente nossa fé é vazia. É meramente fé no conhecimento intelectual que temos sobre Deus e não no que este conhecimento gera em nós em termos de atitudes práticas.

O desfecho da parábola aponta para uma conclusão perscrutadora dirigida ao escriba. Jesus conclui: "Qual destes três te parece ter sido o próximo do homem que caiu na mão de assaltantes?" (v. 36). Ele respondeu: "O que usou de misericórdia para com ele". E então as palavras finais de Jesus: "Vai e procede tu de igual modo".

Salvação pelas obras? Obviamente, não. É preciso entender o contexto. Na estreita compreensão dos escribas e judeus "próximo" não eram outas pessoas senão os de sua própria nacionalidade. O que está em evidência aqui é a questão da xenofobia ou ódio racial que, conforme retromencionado, vinha de longa data. Mas o que isto tem a ver com herdar o reino dos céus, que foi a pergunta inicial que gerou todo este diálogo?

A aplicação que Jesus esperava que os escribas fizessem era no tocante à interpretação e prática da lei. Não basta meramente interpretar a lei, segundo nossas pressuposições. A lição era esta: Se você interpretou e entendeu a lei do amor, então por que não pratica?

Não temos aqui nenhum discurso sobre a salvação pelas obras, entretanto, é óbvio que concomitamente ao chamado irresintível da graça veio também o chamado de Deus para as boas obras que foram "preparadas de antemão para que andemos nelas" (Ef 2. 10).

Como feituras de Cristo temos o dever do testemunho a todas as pessoas indistintamente. É isso que significa "meu próximo" porque "próximo" não é apenas o irmão na fé, mas qualquer pessoa, cuja necessidade presenciada gera em mim o senso do dever. Não podemos ignorar a situação como se não tivéssemos parte no assunto. Uma vez que temos conhecimento da necessidade humana ao nosso redor, não precisamos ter dúvida, quanto a quem é meu próximo, pois meu próximo é todo carente que se declare como tal ao meu redor. No mundo da tecnologia que encurta as distâncias, também deve ser considerado nosso próximo aquelas pessoas que estão longe de nosso contexto social, mas que, uma vez que de nosso conhecimento passam a fazer parte de uma necessidade do próximo que demanda nossa ação. Porque amor se mostra não apenas quando vemos de perto. É próximo todo aquele que, estando longe fisicamente, deixa transparecer por meio tecnológicos de comunicação, necessidades tão prementes e reais quanto àquelas ao meu redor.